domingo, 25 de janeiro de 2009

Qualificações dos pais determinam sucesso escolar dos filhos

Um estudo do Ministério da Educação, que envolveu cerca de 50 mil alunos do 10º. ano, concluiu que as qualificações escolares e profissionais dos pais têm influência no desempenho escolar dos filhos.
As diferenças de desempenho escolar dos alunos do secundário surgem associadas às qualificações escolares e às profissões dos pais, sendo pouco relevantes factores como a origem étnico-nacional, revela o estudo divulgado na última semana.
A análise abrangeu 588 escolas públicas e privadas das diferentes regiões do País e baseou-se em inquéritos a 46.175 alunos do 10.º ano ou equivalente (correspondente a 44 por cento do universo), a frequentar as diferentes modalidades do nível secundário no terceiro trimestre de 2007/2008.
De acordo com o estudo intitulado "Estudantes à entrada do ensino secundário", factores como a origem étnico-nacional, línguas faladas e participação dos pais em diferentes aspectos da vida escolar dos alunos têm pouco ou nenhum peso na explicação do desempenho escolar dos alunos.
Os estudantes que ingressaram no 10.º ano ou equivalente em 2007/08 têm um perfil social com uma representação algo elevada de grupos com maior vantagem socioeconómica, refere a pesquisa. O percurso escolar destes estudantes caracteriza-se por uma fraca incidência da retenção, nomeadamente retenções precoces (no 1.º e 2.º ciclo do ensino básico), por uma quase total inexistência de interrupções dos estudos e um predomínio de classificações positivas, indica o documento. O estudo refere ainda que os estudantes do 10.º ano ou equivalente inquiridos têm na quase sua totalidade nacionalidade portuguesa (95,4 por cento). Relativamente à origem étnico-nacional, 80,7 por cento dos alunos têm origem portuguesa, 7,8 por cento têm origem luso-africana, quatro por cento são descendentes de ex-emigrantes e 2,2 por cento têm origem luso-europeia.
Uma proporção significativa das famílias/responsáveis dos alunos inquiridos têm o 2.º ciclo do ensino básico ou menos concluído (36,2 por cento), seguido do 3.º ciclo do ensino básico (23,9 por cento), do ensino secundário (21,6 por cento) e do ensino superior (18,3 por cento).
A análise da origem socioprofissional dos estudantes revela que os alunos provêm em maior proporção de famílias com categorias mais providas de recursos, caso dos "Empresários, Dirigentes e Profissionais Liberais" (41,4 por cento) e dos "Profissionais Técnicos e de Enquadramento" (16,5 por cento). Raparigas com desempenho escolar mais elevado que os rapazesEm termos globais, constata-se que à entrada do secundário existem mais raparigas do que rapazes, o que está associado a perfis de desempenho escolar mais elevados por parte das alunas.
No que se refere à escolha da escola, os estudantes seleccionam-na principalmente em função da proximidade da residência e da oferta escolar, embora o factor amigos e o facto de os próprios alunos já terem estado nesse estabelecimento também tenham alguma relevância.Quanto à questão da mudança de cursos, na maioria das situações, são os alunos dos cursos científico-humanísticos que, proporcionalmente, mais referem pretender mudar para um curso profissionalmente qualificante.Refira-se que o estudo, realizado pelo Observatório de Trajectos dos Estudantes do Ensino Secundário (OTES) do Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação foi realizado com o objectivo de produzir e analisar informação relevante para os processos de tomada de decisão relativamente ao ensino secundário.
Cultura familiar é o que está na base do sucessoEmbora a escolarização dos portugueses tivesse aumentado há 30 anos, com o 25 de Abril, de um modo geral, e estatisticamente, «Portugal é um País com pessoas de muito pouca escolaridade». Quem o diz é Pedro Vasconcelos, sociólogo da família do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), em Lisboa, que recordou o facto de, no início dos anos 50, pouco mais de 90 por cento da população tinha no máximo a 4ª. classe e que há 15 anos o País tinha o número de analfabetos que a Holanda tinha em 1890.Mas, de acordo com estudo realizado pelo Ministério da Educação, reconhece um progresso na qualificação das gerações mais novas, considerando que os alunos do secundário têm agora mais qualificações que os pais. Situação que, na sua opinião, se deve ao factor cultural.
Quanto a outra conclusão do estudo dar conta que o sucesso escolar depende muito da origem social, refere que tal circunstância significa que o conseguir ir mais longe nos estudos «depende da escolaridade dos pais». Trata-se, porém, de um «resultado de desigualdade social, considerando que o sucesso escolar é um resultado que foi encontrado em todos os contextos nacionais». O sociólogo destacou que esta é uma realidade, pois há pessoas cujos pais são analfabetos e têm sucesso escolar, como também acontece existirem pais com alto nível de habilitações com filhos de fraco desempenho escolar.
Desigualdade deve-se à mais ou menos cultura escolar dos pais
De acordo com Pedro Vasconcelos, as crianças que vêm de uma família com elevados níveis escolares vêm de contextos familiares onde a escola é valorizada.«As pessoas que vêm de contextos sociais mais escolarizados tendem a ter livros em casa e a ler mais, tendem a ter uma linguagem familiar gramaticalmente mais complexa, e tendem a ter acesso a referências culturais (cultura geral) muito mais desenvolvida do que as pessoas que vêm de contextos familiares que não têm recursos escolares», exemplificou. Enquanto que, por outro lado, as pessoas que vêm de origem com baixos recursos escolares «tendem a ser pessoas que acabam por incorporar inconscientemente, que a escola não serve para muito e adaptam-se facilmente à sua falta de recursos escolares».
Uma boa situação financeira de origem significa que os pais podem oferecer melhores condições de habitação aos filhos, com espaços propícios ao estudo, e ainda porque podem investir mais na formação escolar das crianças, colocando-as nas melhores escolas e pagando-lhes explicações. «Obviamente que influencia e ajuda, mas o grande factor não é monetário, é cultural», concluiu o sociólogo.
Atenuar as diferenças sociais é imprescindível
Jorge Moreira corrobora as conclusões do estudo, referindo que o nível de aproveitamento do aluno «depende muito da literacia dos pais». O presidente do Conselho Executivo da Escola Secundária Jaime Moniz entende que quanto mais formação tiverem os pais mais sensibilizados estão para os currículos e melhor apoio podem dar aos seus filhos.Além disso, é da opinião que o factor socioeconómico «tem, sem dúvida alguma, influência». É por isso que, destacou, existe o apoio da Acção Social Escolar «que é uma forma de tentar minorar os efeitos perversos da desigualdade de oportunidades». O professor disse, contudo, que nalguns casos de boas condições financeiras, os pais que muitas vezes passam pouco tempo com os filhos devido ao trabalho, não lhes dando a atenção necessária. Todavia, «há casos de pessoas humildes em que os filhos estão bem orientados e conseguem bom aproveitamento», apontou.
Mas para que o desempenho escolar possa ainda ser mais generalizado, Jorge Moreira referiu que a democracia tende a melhorar as diferenças e criar maior grau de oportunidades. «O fosso social tem que ser sempre atenuado e é por isso que existem os mecanismos de Acção Social Escolar», recordou, defendendo maior apoio e discriminação positiva para os que necessitam mais.
Por Cristina Sousa (in Jornal da Madeira)
Cristina Sousa

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