domingo, 28 de dezembro de 2008

A 'chatice' de educar

Mais de uma semana depois de um grupo de alunos ter apontado uma pistola de plástico a uma professora aparentemente calma, mas que abandonou a sala de aula a ameaçar uma turma do 11.º com falta disciplinar, e um dia depois de o JN ter revelado em primeira mão as cenas de indisciplina, o Conselho Executivo (CE) da Escola EB 2,3/S do Cerco do Porto decidiu abrir um inquérito.

O óbvio procedimento disciplinar agora decretado não deixa de espantar quem ouviu a presidente do CE do Cerco considerar uma "chatice" não o caso, mas, antes, a sua revelação pública. Ou a responsável da DREN, a classificar de "brincadeira" as cenas filmadas com um telemóvel, em que um aluno também encostava a dita pistola à nuca e cabelos da docente, enquanto outro simulava golpes de boxe e um terceiro mexia no que aparenta ser o computador pessoal da professora.

A displicência destas reacções parece ter uma explicação: como não houve violência física (ou ela não é vista nos 31 segundos de vídeo) e a pistola até era de plástico, se dependesse daquelas responsáveis o comportamento dos alunos seria desculpado. Mas, depois da pressão mediática - e só depois desta -, o inquérito vai avançar e o próprio procurador-geral da República promete estar atento às suas conclusões. Para já, foram ouvidos apenas alguns alunos envolvidos em mais um caso de indisciplina grosseira. Sobram perguntas: serão eles os únicos responsáveis pela galhofa em que se transformou aquela sala de aula de um bairro problemático do Porto? Achará a professora normal a violência simbólica de que foi alvo? É calando casos deste tipo que o CE do Cerco pretende inverter a sua posição na cauda dos rankings escolares? E, depois de ter tomado conhecimento de toda esta situação, que dizer das palavras (ou da ausência delas) de Margarida Moreira?

Neste, como em tantos outros casos de indisciplina, os alunos não podem ser os únicos responsáveis pelo desnorte que reina em inúmeras escolas e a solução para estes problemas não pode ser, como defendeu o inenarrável presidente da Federação das Associações de Pais do Porto, insistir na proibição dos telemóveis na sala de aula. Até porque, como demonstra este caso, só existem (será que existem?) consequências quando as cenas de violência são filmadas.
Se o que não é conhecido não existe, manter situações de indisciplina dentro de portas, ocultando-as, é nada fazer para que a escola seja, de uma vez por todas, um lugar de formação. E esse comportamento também deve ser analisado num qualquer inquérito.

In Jornal de Notícias - Alfredo Leite, Director Adjunto

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